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segunda-feira, 31 de março de 2014

Sutra Lankavatara - Capítulo 8

O Sutra Lankavatara é um texto importante para o Budismo Mahayana, principalmente para as tradições chinesas e japonesas. Basicamente é um diálogo entre o Buda e um bodhisattva chamado Mahamati (Grande Sabedoria). O capítulo VIII aborda a alimentação vegetariana e merece muita atenção. Eu tenho certeza que muita gente deve achar esse assunto por demais recorrente aqui no blog. Só posso afirmar que se essa orientação fosse seguida, compreenderiam a razão. Boa leitura!
Marcelo Prati

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Sutra Lankavatara
Capítulo 8 - Deixem de Comer Carne

Naquele momento, Mahamati, o Bodhisattva-Mahasattva[1], perguntou ao Bhagavan  em versos e fez um pedido dizendo:

Me diga Bhagavan, Tathagata, Arhat[2], Completamente Iluminado, sobre os méritos de não se comer carne e sobre o vício de se comer carne; assim eu e outros bodhisattvas do presente e do futuro poderemos ensinar o Dharma  e fazer os seres abandonarem sua ganância por carne, sob a influência do hábito da existência carnívora, fortemente apegada a alimentos que contenham carne. Tais comedores de carne, abandonando seu desejo por esse sabor, buscarão o Dharma[3] por alimento e obterão júbilo, considerando todos os seres com amor, como se fossem seus próprios filhos, se alegrarão sentindo grande compaixão por eles. Sentindo tal grande compaixão, eles se disciplinarão até atingir os estágios do Bodhisattva e rapidamente despertarão para a suprema iluminação; ou permanecendo por um tempo no estágio do Sravaka e Pratyekabuddha[4], eles finalmente atingirão o mais alto estagio do Tathagata.

Bhagavan, mesmo aqueles filósofos que mantém doutrinas errôneas e são adeptos de visões mundanas como o dualismo do ser ou não-ser, do niilismo e eternalismo, proibirão o ato de comer carne e eles mesmos hão de se abster de comê-la. Como, ó Guia do Mundo, tu que promoves o gosto pela piedade e é Completamente Iluminado; não proibiria em seus ensinos o ato de comer carne, não apenas para si, mas também para todos? Claro, deixe o Bhagavan, que no coração está cheio de piedade pelo mundo, que considera todos os seres como seus filhos e que possui a grande compaixão em conjunto com sua compreensão, nos ensine sobre o vício de comer carne e o mérito de não comer para que assim eu e outros Bodhisattvas-Mahasattvas ensinemos o Dharma.

Disse o Bhagavan:

Então, Mahamati, ouça atentamente e reflita bem dentro de si; Eu te direi.

Certamente, Bhagavan - disse Mahamati, o Bodhisattva-Mahasattva, e deu ouvidos ao Bhagavan.

O Bhagavan disse assim:

Por inumeráveis razões, Mahamati, o bodhisattva, cuja natureza é a compaixão, não deve comer carne. Eu as explicarei. Mahamati, nesse longo curso de renascimentos, não há nenhum ser vivo que, tendo assumido uma forma de ser vivo, não possua mãe, pai, irmão ou irmã, filho e filha, ou um e outro e vários níveis de parentesco, assumindo uma ou outra forma de vida, seja como uma fera, animal doméstico, pássaro ou um nascido de útero, ou com qualquer outro tipo de relação contigo. Sendo assim, como um Bodhisattva-Mahasattva que procura aproximar-se de todos os seres como se fossem ele mesmo e praticar a verdade do Buda, pode comer carne de seres vivos que possuem a mesma natureza que ele próprio? Mahamati, até mesmo um Raksasa[5] que ouça o discurso do Tathagata sobre a mais alta essência do Dharma, se ele atingir a percepção de proteger o Budismo e sentir piedade, abstém-se de comer carne; quanto mais devem fazer aqueles que amam o Dharma! Então, Mahamati, onde quer que haja o desenvolvimento de seres, que as pessoas possam nutrir o pensamento do parentesco com eles, e pensando que todos os seres devem ser amados como se fossem filhos únicos, que assim eles se abstenham de comer carne. Então que os Bodhisattvas, cuja natureza é a compaixão, sejam avessos a comer carne. A carne de um cão, burro, búfalo, cavalo, touro, de homem ou de qualquer outro ser, Mahamati, não é para ser comida por pessoas, ela é vendida na beira das estradas apenas pelo amor pelo dinheiro; portanto, Mahamati, o Bodhisattva não deve comer carne.

Por amor à pureza, Mahamati, o Bodhisattva deve abster-se de comer carne que é fruto de sêmen e sangue. Por temer causar terror aos seres vivos, Mahamati, que o Bodhisattva que se disciplina buscando a compaixão, abstenha-se de comer carne. Para ilustrar, Mahamati: Quando um cão vê, mesmo à distância, um caçador, um sem casta, um pescador, etc., que deseja tal alimentação com carne, ele é tomado pelo terror, pensando, "Eles são mercadores da morte, eles me matarão!" Da mesma forma, Mahamati, mesmo aqueles pequeninos animais que habitam no ar, na terra e na água, vendo comedores de carne à distância, ao percebê-los, através de seus aguçados sentidos, sentem o cheiro de um demônio e fugirão de tais pessoas tão rápido quanto puderem; pois essas pessoas são para eles ameaça de morte. Por tal razão, Mahamati, que o Bodhisattva, que busca disciplinar-se, permanecendo na grande compaixão, evitando aterrorizar os seres, abstenha-se de comer carne. A comida dos sábios, Mahamati, é aquela comida pelos Rishis  e não consiste de carne e sangue. Assim, Mahamati, que o Bodhisattva se abstenha de comer carne.

De modo a preservar as mentes de todos, Mahamati, que o Bodhisattva, cuja natureza é santa e cujo anseio é evitar cometer faltas no ensino do Buda, abstenha-se de comer carne. Por exemplo, Mahamati, há alguns no mundo que difamam o ensino do Buda; eles diriam, "Por que razão tais monges que dizem empenhar-se em puras práticas, rejeitam as oferendas dos seres celestiais, mas como animais carnívoros que preenchem seus estômagos com carnes, perambulam pelo mundo assustando os seres, desconsiderando como deve ser a vida de um monge e destruindo o voto de um brâmane[6]? Não há Dharma nem disciplina neles." Há muitos assim de mente hostil que falam inverdades do ensino do Buda. Por tal razão, Mahamati, de forma a proteger a mente de todas as pessoas, que o Bodhisattva, cuja natureza é plena em piedade e cujo anseio é evitar cometer faltas no ensino do Buda, não deve comer carne.

Mahamati, um cadáver possui um cheiro ofensivo, que é desagradável; assim, que o Bodhisattva se abstenha de comer carne. Mahamati, quando carne é queimada, não importa se é de uma pessoa ou de qualquer outra criatura, não há diferença no odor. Quando carne de qualquer tipo é queimada, o cheiro exalado é igualmente nocivo. Assim, Mahamati, que o Bodhisattva, cujo anseio é a pureza em sua disciplina, abstenha-se de carne.

Mahamati, quando filhos e filhas de boas famílias, desejando exercitar a si próprios em várias disciplinas como alcançar um coração compassivo, praticar mantras, atingir o conhecimento superior, entender o Mahayana[7], retiram-se em um cemitério, ou adentram à floresta, demônios se juntam e frequentemente o perturbam. Quando eles tentam sentar-se em meditação ou para algum desses exercícios, eles são impedidos, por terem se alimentado de carne, de obter sucesso ou de atingir a liberação. Mahamati, percebendo que isso é um obstáculo para o sucesso em todas as práticas budistas, que o Bodhisattva, que anseia o benefício próprio e também o de outros, completamente se abstenha de comer carne.

Tal como a visão das formas objetivas faz surgir o desejo por sentir um delicioso sabor, que o Bodhisattva, cuja natureza é a piedade e que considera a todos os seres como se fossem um filho único, abstenha-se de comer carne. Reconhecendo que sua boca, mesmo em vida, emitirá um odor pútrido, que o Bodhisattva, cuja natureza é a piedade, totalmente se abstenha de comer carne.

O comedor de carne dorme mal e acorda perturbado. Ele tem pesadelos horríveis. Ele é sempre abandonado, vive uma vida de solidão e seu espírito é atormentado por demônios. Frequentemente ele é tomado pelo medo, ele treme sem saber a razão, sua alimentação é irregular e ele nunca está satisfeito. Ele tem o paladar prejudicado, assim como seu processo digestório e também sua nutrição. Ele considera normal a sensação de estar doente. Se eu ensino que se deve considerar a comida como se fosse carne de seu próprio e único filho[8] ou como tomar um remédio, como eu poderia permitir aos meus discípulos, Mahamati, que comessem comidas que consistem de carne e sangue, que são gratificantes ao estúpido, mas são rejeitadas pelo sábio, que produzem toda espécie de mal e mantém afastados muitos méritos, que não foi oferecia aos Rishis e que é completamente inadequada?

Agora, Mahamati, a comida que eu permiti que meus discípulos tomassem, é aquela gratificante a todas as pessoas sábias, mas é evitada pelo tolo; ela produz tantos méritos, mantém afastado todo o mal e foi prescrita pelos antigos Rishis. É composta de arroz, cevada, trigo, feijão, lentilhas, manteiga, azeite, mel, melado, cana de açúcar, açúcar mascavo, etc. Os alimentos preparados com tais ingredientes são apropriados. Mahamati, haverá muitas pessoas irracionais no futuro que vão inventar e estabelecer novas regras de disciplina moral e que, sob a influência desse mau hábito típico de raças carnívoras, vão sentir a ganância pelo sabor da carne: não é para tais pessoas que essa minha alimentação é prescrita. Mahamati, essa é a alimentação que eu incito aos Bodhisattvas-Mahasattvas que têm feito oferendas a muitos Budas no passado, que plantaram raízes de bondade, que possuem confiança, desprovidos de discriminação, são todos homens e mulheres pertencentes à família Sakya[9], que são filhos e filhas de boa família, que não possuem mais apego ao corpo, à vida ou às posses, que não cobiçam iguarias, de nenhuma forma são gananciosos, que se tornando compassivos, tendem a abraçar todos os seres como se fossem ele mesmo e que consideram todos os seres com tal afeição como se fossem seu único filho.

Há muito tempo no passado, Mahamati, viveu um rei chamado Simhasaudasa. Ele era apreciava muitíssimo comer carne, sua avidez por comê-la estimulou-o tanto que ele chegou ao auge dessa barbárie, no ponto de comer carne humana. Em consequência disso, ele tornou-se sem amigos verdadeiros, não ouvia mais seus conselheiros, compatriotas, parentes, nem falava mais aos cidadãos e habitantes daquele país. Ao fim, ele acabou renunciando ao trono e aos seus domínios, sofrendo grandes calamidades devido a sua paixão por comer carne.

Indra
Mahamati, mesmo o deus Indra que possui a soberania sobre os deuses, numa existência anterior, teve de nascer na forma de um gavião devido à força do hábito de comer carne; ele então perseguiu Visvakarma, que naquela ocasião havia se manifestado na forma de uma pomba, colocando-se assim em seu lugar na escala alimentar. O Rei Sivi, sentindo profunda piedade pelo sacrifício da inocente pomba para o gavião, sentiu uma dor profunda. Mesmo um deus que tornou-se Indra o Poderoso, depois de atravessar vários nascimentos, Mahamati, está sujeito a trazer o infortúnio a si próprio e aos outros; quanto mais aqueles que não são Indra!

Mahamati, houve outro rei que foi levado por seu cavalo para dentro de uma floresta. Depois de perambular por lá, ele, não temendo por sua própria vida, acabou por cometer um ato reprovável com uma leoa e gerou filhos nela. Devido a esse fato, seus descendentes da união com a leoa eram chamados de Pegadas-Visíveis[10]. Devido aos hábito que tinham no passado, quando seu alimento era carne, eles continuaram a comer carne mesmo depois de se tornarem reis. E Mahamati, naquela mesma vida eles abandonaram o reino e habitaram um aldeia chamada Kutiraka e por causa do seu excessivo apego e devoção à alimentação de carne, eles deram nascimento a Dakas e Dakinis[11] terríveis e comedores de carne humana. Numa vida de renascimentos, Mahamati, aqueles que caem dentro de úteros de tais descontroladas criaturas comedoras de carne como leões, panteras, tigres, lobos, hienas, chacais, gatos do mato, corujas, etc., cairão dentro de úteros de seres ainda mais ambiciosos por devorar carne até tornarem-se terríveis Raksasas. Descendo cada vez mais, será praticamente impossível de obter nascimento num útero humano; quão mais difícil ainda será atingir o nirvana!

Dessa forma, Mahamati, são os malefícios de se comer carne; quão mais numerosas características maléficas nascem nas mentes perversas daqueles devotados a esse ato. Mahamati, os ignorantes e simplórios não estão atentos a estes e tantos outros malefícios e nem aos méritos de não se comer carne. Eu te digo Mahamati, que sendo capaz de ver tais malefícios e méritos, que o Bodhisattva, cuja natureza é a piedade, não deve comer carne.

Raksasa
Mahamati, na maioria dos casos, chacinas são cometidas por comedores de carne. Se ninguém comesse carne, não haveria destruidores da vida, comer carne é exatamente o mesmo que matar. Aqueles no mundo, que se viciam no sabor da carne, poderiam comer até mesmo carne humana e não notar a diferença, isso sem falar da carne de pássaros, animais selvagens e assim por diante. Mahamati, por muitas vezes, redes e armadilhas são preparadas em vários lugares por pessoas que perderam seu bom senso devido a seu apetite por saborear carne e desse modo, tantas vítimas inocentes são destruídas, pagando o preço desse desejo, usando armadilhas para pássaros ou redes para pegar peixes ou outros seres que estão se movendo pelo ar, na terra e na água. Há até mesmo, Mahamati, aqueles que são como Raksasas de coração duro e acostumados a praticar crueldades, que sendo tão vazios de compaixão, por diversas vezes procuram seres para se alimentar e destruí-los. Não há nenhuma compaixão desperta neles.

Não é verdade, Mahamati, que carne seja uma comida apropriada e permitida aos monges, quando a vítima não tenha sido assassinada por ele mesmo, mesmo que ele não tenha pedido para ser morta ou que não tenha sido preparada exclusivamente para ele. Novamente, Mahamati, pode haver pessoas loucas no futuro, que vivam a vida de monges de acordo com meus ensinos, sejam reconhecidos como filhos de Sakya e portem o manto Kasaya[12] ao redor de seu corpo, mas que sejam, em pensamentos, malignamente afetados por raciocínios errôneos. Eles poderão falar de vários aspectos em suas vidas morais, ou estar apegados à ideia da existência de uma alma. Sob a influência do desejo pelo sabor da carne eles conduzirão, de várias formas, argumentos distorcidos para defender a alimentação com carne. Eles vão achar que me caluniam ao falar e explicar ideias que podem gerar diversas interpretações. Imaginando que tais ideias permitem uma interpretação desse tipo, concluem que o Bhagavan, de alguma maneira, permite que se coma carne e que isso é mencionado dentre os alimentos permitidos e que provavelmente o próprio Tathagata tenha tomado parte nisso. Mas, Mahamati, não há nenhum lugar nos sutras onde a alimentação de carne seja permitida como sendo algo aprazível, nem é referia como alimento apropriado ou prescrito para os seguidores do Buda.

Se, contudo, Mahamati, eu tivesse intenção de permitir que se comesse carne, ou eu tivesse dito que era apropriado para os Sravakas, eu não teria proibido. Eu não teria proibido a doentia alimentação com carne para tais yogues, filhos e filhas de boas famílias, que, nutrindo a ideia de que todos os seres são como um filho, possuem compaixão, praticam a contemplação, disciplina e estão no caminho do Mahayana. E Mahamati, a proibição de se comer qualquer tipo de carne está aqui dada a todos os filhos e filhas de boas famílias, quer sejam ascetas das catacumbas ou das florestas, ou yogues praticando seus exercícios, se eles anseiam o Dharma e estão no caminho, qualquer que seja o veículo, estando de posse da compaixão, concebendo a ideia de auxiliar a todos os seres como se fossem seu próprio e único filho, de maneira que atinjam o objetivo final de seus esforços.

Nos sutras se distribui os diferentes processos de disciplina de um modo sequencial, como uma escada que se sobe degrau por degrau e um alcança o seguinte de modo metódico e regular. Sendo assim, a questão da carne não fica de fora de tais circunstâncias. Além disso, consta nos dez preceitos a proibição sobre a carne de animais encontrados já mortos. Mas neste sutra, todo tipo de consumo de alimentos com carne, de qualquer forma, de qualquer maneira e em qualquer lugar, é incondicionalmente e de uma vez por todas, proibido para todos. Assim, Mahamati, eu não permiti que ninguém comesse carne, não permito e jamais permitirei. Comer carne, eu te digo Mahamati, não é apropriado para monges. Pode haver alguns, Mahamati, que digam que o Tathagata comeu carne, pensando em difamá-lo. Tais pessoas desprovidas de bom senso, seguirão o caminho maléfico de seus próprios impedimentos kármicos e cairão em mundos terríveis onde longas noites se passam sem que se tenha nenhuma alegria. Mahamati, os nobres Sravakas não comem sequer alimentos que são normais às pessoas comuns, quanto menos se alimentam de carne e sangue, que são totalmente impróprios. Mahamati, o alimento de meus Sravakas, Pratyekabuddhas e Bodhisattvas é o Dharma e não carne; o que dizer então do alimento do Tathagata! O Tathagata é o Dharmakaya, Mahamati. Ele habita no Dharma que você toma como alimento; ele não é um corpo que se alimenta de carne, ele não se encontra em nenhum pedaço de carne. Ele extinguiu os hábitos que geram a sede e o desejo que sustenta toda a existência; ele mantém longe a força do hábito das paixões malignas, ele completamente emancipou sua mente e conhecimento; ele é Onisciente, ele vê tudo, ele considera todos os seres como se fossem seu filho único, ele possui um coração da grande compaixão. Mahamati, considerando os seres como um próprio e único filho, como eu sendo assim, permitiria que os Sravakas comessem a carne de seus filhos? Muito menos eu comeria! Afirmar que é permitido aos Sravakas ou a mim mesmo, tomar parte desse tipo de alimentação, Mahamati, não tem o menor fundamento.

Então é dito que:
Licor, carne e cebolas[13] devem ser evitadas, Mahamati, pelos Bodhisattvas-Mahasattvas e por todos aqueles que são heróis vitoriosos.
Carne não é aceitável pelo sábio; possui um odor nauseante, causa má reputação, é comida de carnívoros, sou eu quem diz isso, Mahamati, não deve ser comida.
Para aqueles que comem carne há resultados danosos, para aqueles que não comem há méritos; Mahamati, você deve tomar conhecimento de que os comedores de carne atraem tais efeitos prejudiciais a si próprios.
Que o yogue se abstenha de comer carne, pois poderia ter nascido dele mesmo, envolve transgressão, sendo feita de sêmen e sangue além de causar o terror de seres vivos.
Que o yogue se abstenha de carne, cebolas, licores e alhos.
Que não unte seu corpo com óleo de gergelim, nem durma numa cama com espinhos, pois os seres que habitam cavidades ou também os que não habitam ficarão terrivelmente assustados.
Do ato de comer carne nasce a arrogância, da arrogância vem pensamentos errôneos e de tais pensamentos nasce a ganância. Por essa razão abstenha-se de comer carne.
Dos pensamentos errôneos nasce a ganância e da ganância a mente torna-se confusa. Surge o apego a essa sensação e não se liberta do ciclo de nascimentos.
Pelo desejo de lucro os seres são destruídos, para se obter carne gasta-se dinheiro, ambas ações são malignas e aqueles que realizam tais atos hão de maturar nos infernos mais terríveis.
Aquele que come carne, destruindo as palavras do Muni, é um mal-intencionado; ele é apontado nos ensinamentos do Sakya como o destruidor da alegria neste mundo e no próximo.
Aqueles que realizam as más ações vão para o mais horrível inferno; comedores de carne vão habitar infernos terríveis.
Não há carne considerada pura de três formas; mesmo a não premeditada, não solicitada ou não desejada. Por isso, abstenha-se de comer carne.
Que o yogue não coma carne, ela é proibida por mim e por todos os Budas. Aqueles seres que se alimentam de outros seres renascerão como animais carnívoros.
O comedor de carne é malcheiroso, desrespeitoso e nasce privado de inteligência. Ele nascerá constantemente numa família de açougueiros sem casta.
Do útero de uma Dakini ele nascerá numa família de comedores de carne e então renascerá no útero de um Raksasa ou de uma fera, pertencendo a mais baixa classe de homens.
Comer carne é proibido por mim em sutras como o Hastikakshya, o Mahamegha, o Nirvana, o Anglimalika e o Lankavatara.
Comer carne é condenado pelos Budas, Bodhisattvas e Sravakas. Se alguém come carne e não se envergonha disso, tal pessoa é desprovida de inteligência.
Aquele que evita carne renascerá, devido a esse fato, numa família de brâmanes e yogues, dotado de conhecimento e opulência.
Abstenham-se de toda carne, não importa o que digam sobre saber, ouvir ou suspeitar que ela foi morta para você ou não. Esses teóricos nasceram de famílias de carnívoros e não fazem a menor ideia do que estão falando.
A ganância é um impedimento para a libertação da mesma forma que comer carne e beber licores.
Pode haver um dia em que venham pessoas que façam afirmações estúpidas sobre comer carne como, "Carne é próprio para o consumo, não tem problema, é permitida pelo Buda."
Ou ainda, "comer carne é para sua saúde", novamente eu digo, é como se fosse a carne de um filho. Siga as orientações corretas e seja avesso à carne e então que o yogue siga seu caminho.
Comer carne é proibido por mim em todo lugar e em todo tempo para aqueles que desejam permanecer na compaixão. Quem come carne nascerá no mesmo lugar que o leão, o tigre ou o lobo.
Assim, não coma carne, pois causará escândalo entre as pessoas, impede a compreensão da verdade da libertação. Não coma carne, pois essa é característica dos sábios.
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[1] Bodhi (iluminação) e Sattva (ser), o indivíduo que desperta a aspiração pela iluminação com o intuito de oferecer esse benefício a todos os seres vivos. Maha (grande) sattva é o Bodhisattva num estágio superior.
[2] Títulos honoríficos dos budas.
[3] Ensino.
[4] Lit. Ouvintes e Budas solitários. Os discípulos do ensinamento do Buda e aqueles que praticam sozinhos, sem um mestre.
[5] Tipo de demônio.
[6] Membro da casta sacerdotal.
[7] Grande Veículo, o conhecimento próprio dos Budas.
[8] Veja no Puttamansa Sutta (http://acessoaoinsight.net/sutta/SNXII.63.php)
[9] Ou seja, à família Real, um nobre.
[10] Ou "Pés-Marcados", talvez no sentido de que os resultados das ações eram vistos, mesmo que não tivessem sido eles os agentes iniciais. Ou seja, não se vê os pés, mas se vê as marcas.
[11] Demônios masculinos e femininos comedores de carne humana.
[12] Vestes monásticas.
[13] De fato alguns textos proíbem o uso de determinadas ervas ou temperos de cheiro forte. Alguns deles, culturalmente, eram considerados como sexualmente excitantes, outros, talvez uma consideração sobre não desenvolver mau-hálito ou suor com cheiro forte.

Um comentário:

  1. "Também no tratado do Esforço nos Atos do Bodhisattva, de Santideva consta:
    Ponha em prática fisicamente tais instruções;
    O que se realiza somente com falatório?
    Por acaso uma pessoa adoentada poderá se curar
    apenas lendo um tratado de medicina?"
    (Tsong-Kha-pa. Lam Rim Chen Mo/Grande Tratado sobre os Estados do Caminho da Iluminação)

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